As meninas de 24 anos da minha idade tem dificuldade de se imaginar num ateliê repleto de senhoras de 50 anos, crochetando, tricotando, fazendo mantinhas de tricô com 139 pontos e mais de mil repetições da mesma sequencia de pontos.
Eu não.
O que seria de mim sem esses mantras em forma de pontos? O que seria de mim sem o silêncio absoluto em que nada mais no mundo acontece. Eu, meu novelo, meu silêncio, e meus pensamentos que conseguem espaço junto à concentração. Tão perfeitamente alinhados aos fios. Eu conseguiria fazer isso por horas se não fossem as cicatrizes no meu seio direito que ainda doem e me obrigam a parar.
Que pena.
Minha terapia vem em novelos de até mil metros. Tem cores tão variadas que apenas uma cor ganha um leque de tons absurdamente possível. É barato, esquenta no inverno, e me acalma. Faz do silêncio algo duplamente produtivo. Quase sempre a Keyshia Cole me acompanha durante algumas receitas. Outras vezes a memória de outros tempos, outros dias, outros verões me obriga a parar antes das dores no seio, embasando a vista.